Karl Marx: as mulheres como “propriedade comum” e o dito “comunismo vulgar”
- Jornal A Pátria
- 13 de ago. de 2018
- 3 min de leitura
Atualizado: 27 de set. de 2022
(Bruno Torres, 20 de dezembro de 2017).

É de praxe utilizarem a citação de Marx encontrada nos MEF (Manuscritos Econômico Filosóficos) em que ele cita que as mulheres por meio da instituição histórica do matrimônio constituem-se como uma forma de propriedade privada.
Em seguida há alguns comentários em que o próprio fala sobre o comunismo, e da questão que estas mulheres se tornariam “propriedade comum” da sociedade (dos homens), como se o fossem “socializadas” (iguais os meios de produção deveriam o ser).
Muito comum entre “marxistas” irrefletidos é a tentativa de “contextualizar” essa citação no intuito de dizer que “na verdade o Marx quis dizer com essa citação que as mulheres serão mais livres e poderão se relacionar com todos os homens, com quem bem entender, é uma forma de falar da libertação das mulheres”, lembrando inclusive as mais pueris defesas do “carne livre…” perdão, digo, do “amor livre”.
Esta citação costuma ser usada à esquerda para justificar em Marx este tipo de posição pueril, assim como costuma ser utilizada à direita para jusficar acusações contra Marx de que ele defendia com o comunismo a “prostituição universal das mulheres”, “tornar as mulheres propriedade comum de todos, já que no capitalismo elas são propriedade privada de uns”.
Ambos caem numa sina burra e irrefletida e parecem não perceber que o que Karl Marx faz é justamente criticar e caçoar (!!!) de tal tipo de conclusão.
Vejamos, portanto, mais atentamente, as próprias palavras de Karl Marx.
O casamento (que é incontestavelmente a forma de propriedade privada exclusiva) é posto em contraste com a comunidade das mulheres, em que estas se tornam comunais e ‘propriedade comum’. Pode-se dizer que essa ideia de comunidade das mulheres é o segredo expresso desse comunismo inteiramente vulgar e irrefletido (MARX, Karl. 1844).
Como vemos, aqui Marx pontua que estas conclusões são justamente a de um “comunismo” vulgar, ignorante, rude, sem reflexões reais!
Segundo esse comunismo vulgar, continua Marx:
As mulheres terão de passar do matrimônio para a prostituição universal, igualmente todo o mundo das riquezas (i. e., o mundo objetivo do homem) terá de passar da relação de casamento exclusivo com o proprietário particular para a de prostituição universal com a comunidade. (MARX, Karl. 1844).
Isso é, a prostituição universal com a comunidade de todos os homens. Seguindo:
Esse comunismo, que nega a personalidade do homem em todos os setores, é somente a expressão lógica da propriedade privada, que é essa negação. (MARX, 1944).
Aqui, Marx diz que justamente quem chega a estas conclusões, como os tais comunistas vulgares chegaram, o fazem porque negam a personalidade dos seres humanos em todos os aspectos (inclusive moral), e diz que eles só concluem tais groselhas filosóficas justamente porque estes “comunistas” são reflexos da própria lógica da propriedade privada! Ou seja, não passam de liberais!
A inveja universal estabelecendo-se como uma potência é apenas uma forma camuflada de cupidez que se reinstaura e satisfaz de maneira diferente. Os pensamentos de toda propriedade privada individual são, pelo menos, dirigidos contra qualquer propriedade privada mais abastada, sob a forma de inveja e do desejo de reduzir tudo a um nível comum; destarte, essa inveja e nivelamento por baixo constituem, de fato, a essência da competição (MARX, Karl. 1844).
Isso é, tornar as mulheres – que são no patriarcado a propriedade individual de um homem – a “propriedade comum” de todos homens”, é o no campo da moralidade, equivalente as anedotas do campo econômico dos que acham que o comunismo deve ser pura e simplesmente atacar uma propriedade abastada e distribuir em pequenas parcelas à todos, tornando todos “igualmente pobres”, nivelando todos por baixo para que tenham “chances iguais”. Isso parte dos pressupostos, como o próprio Marx diz, da essência da competição. É partir da lógica da propriedade privada ao invés de superá-la!
Como dito:
“O comunismo vulgar é apenas o paroxismo de tal inveja e nivelamento por baixo, baseado em um mínimo preconcebido” (MARX, 1944).
Quão pouco esse tipo de eliminação da propriedade privada representa uma apropriação genuína (nota: isso é, uma apropriação genuína do proletariado, rumo ao comunismo) é demonstrado pela negação abstrata de todo o mundo da cultura e da civilização, e pelo retorno à simplicidade não natural do pobre e indigente que não só ainda não ultrapassou a propriedade privada, mas nem ainda a atingiu (MARX, Karl. 1844).
Como podemos ver, não Marx afirma que este tipo de proposição não supera realmente a propriedade privada, como na verdade nem chega à “atingi-la”, é nada mais do que a propriedade privada “nivelada por baixo”.
Para Marx há que se considerar sim os aspectos culturais, morais, etc., da civilização em que a humanidade se situa.
Propor um “retorno” a um estágio que ele considera “não natural” de uma “simplicidade” pobre que não tem a ver com o socialismo.
Quem faz cegamente uma apologia com vistas a retornar a humanidade a “estágios anteriores” e “primitivos” de relacionamento se equivoca das mais variadas formas possíveis, e não passa de um parcial defensor dos próprios postulados da propriedade privada e do liberalismo.
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