A definição de Capitalismo e Liberalismo & O anacronismo político dos liberais
- Jornal A Pátria
- 29 de jan. de 2014
- 10 min de leitura
Atualizado: 19 de dez. de 2019
(Bruno Torres, 29 de janeiro de 2014).

Muitos liberais pautam o liberalismo como um sinônimo absoluto do capitalismo. Nós comunistas sabemos que são coisas plenamente interligadas, mas não são necessariamente a mesma coisa. Então, com base em referências históricas, esse texto deixa claro este mau uso do termo “capitalismo” (como algo equivalente a “liberalismo”).
É comum que as pessoas confundam o significado do termo Capitalismo, principalmente em debates, no entanto, isso é grave erro. Quando o termo capitalismo é cunhado como equivalente de liberalismo, legitima que indivíduos, por desonestidade intelectual preguem que “Se capitalismo = liberalismo, quanto mais liberal um país é, mais capitalista o país é”.
No entanto, são termos de significados diferentes.
O QUE É ENTÃO, LIBERALISMO?
O Liberalismo se trata do “deixar passar, deixar fazer”. É um movimento que prega a liberdade econômica, bem como uma baixíssima intervenção do Estado ou governo na economia. Em resumo, trata-se de um movimento contra intervenções do Estado na sociedade burguesa, no que concerne a economia. Apenas isso. Pode-se aprofundar mais sobre a definição de liberalismo, no entanto, mesmo que nos aprofundemos no estudo de sua definição, não vai divergir dessa definição geral.
Bem, já sabemos do que se trata o liberalismo. Mas e o capitalismo? Porque suas definições não são equivalentes? Quem as pautou? Quem foram as figuras que utilizaram [ou atribuíram um significado a] este termo primeiramente?
O QUE É ENTÃO, CAPITALISMO?
O uso inicial do termo capitalismo – em seu sentido moderno – foi atribuído a Louis Blanc (figura importante do movimento conhecido como socialismo francês) em 1850, e Proudhon (famoso anarquista) em 1861. Logo após o socialista utópico Blanc e Proudhon, Karl Marx e Friedrich Engels se referem ao sistema capitalista e ao modo de produção capitalista em “O capital”, em 1867. O uso da palavra capitalismo em referência a um sistema econômico aparece duas vezes no Volume I de O Capital, na pagina 124 e 493 (da Edição alemã).
Os próprios anticapitalistas (desde os utópicos como Blanc e Proudhon, aos científicos como Marx e Engels) foram os que “criaram”, ou melhor, deram uma definição mais contundente e nítida ao termo Capitalismo.
Capitalismo passou a ser entendido pela perspectiva marxista da história, como o modo de produção social posterior ao modo de produção feudal. O feudalismo, no caso, se configura pela predominância da exploração do trabalho de uma classe pela outra, por meio da servidão. O capitalismo, nesse mesmo sentido, se configura pela predominância da exploração do trabalho de uma classe pela outra, por meio de um “livre-contrato”, no trabalho assalariado.
PELO QUE OS LIBERAIS LUTAM?
Um fato muito comum é ver muitos liberais esbravejando e afirmando que capitalismo na verdade é um termo vinculado aos teóricos do liberalismo, e que o “capitalismo malvado” é somente o “corporativismo”, o “capitalismo interventor”. Nesse sentido, se opondo ao caráter monopolista da atual fase do capitalismo, eles pregam o combate contra esse monopolismo, e lutam pela total liberdade comercial. Na cabeça dos liberais, tudo gira em torno de uma dualidade entre “governo e mercado”, e por isso sua palavra de ordem para o mercado é: MENOS MONOPÓLIO, MAIS CONCORRÊNCIA.
Acreditam que “o livre-mercado” é o ápice das relações econômicas, e que o vilão maior é o Estado-interventor! Neste caso, pregam que o Estado tenha menos ainda poder de interferir na economia. A luta de tais liberais, não é “a luta por mais capitalismo” (ao contrário do que eles pensam), mas sim uma luta para que ele deixe de ser um “Capitalismo Corporativista e Monopolista” e passe a ser um “Capitalismo com mais concorrência”. Quem alega que a luta deles é por “mais capitalismo” discursa uma lógica falaciosa.
UMA SOCIEDADE “MAIS CAPITALISTA”?
O Capitalismo trata-se de um modo de produção econômico pautado principalmente no antagonismo de duas classes: A burguesia e o proletariado. Nas relações de produção desse modo de produção econômico, há a apropriação do trabalho de uma imensa massa de trabalhadores por uma minoria que se situa no topo da sociedade. Essa apropriação do trabalho alheio se dá por meio de um “livre-contrato”. Se esse tipo de relação numa sociedade for predominante na mesma, essa sociedade pode ser caracterizada como Capitalista.
Se essa é a definição base, e o critério para uma sociedade ser ou não capitalista, quanto mais capitalista a sociedade for, não necessariamente ela será mais economicamente liberal, mas sim que, na verdade ela terá uma disparidade cada vez maior entre as classes antagônicas. Nesse sentido, uma “sociedade mais capitalista” não quer dizer necessariamente que ela será uma “sociedade capitalista com mais liberdade econômica”.
“ANACRONISMO LIBERAL”: O LIBERALISMO, ENQUANTO CONJUNTO DE VALORES IMPULSIONADO POR INTERESSES DE CLASSE, ESTÁ MORTO
A luta dos atuais liberais, do que eles reivindicam, dentro do atual sistema político-econômico, se dão mais ou menos, nas bandeiras que já foi falada neste texto: mais concorrência, menos intervenção do Estado na economia, “diminuição do Estado” (no sentido econômico e de tributos) e etc. No entanto, do ponto de vista histórico, bem como do ponto de vista da política atual, facilmente observamos que essas bandeiras somente servem a dois propósitos que se mesclam entre si: “tampar o sol com a peneira” e servir a reação.
A ideologia e os valores dominantes de uma época correspondem aos interesses materiais de uma classe econômica de uma época. Foi nesse sentido que surgiram as ideias liberais de séculos atrás.
O burguês vem de um mundo hostil e duro (o mundo “das Trevas” do feudalismo) – pelo menos hostil a seu modo de viver e de se relacionar economicamente. Essa burguesia, antes vinda desse mundo hostil, vai cada vez mais, ganhando mais e mais espaço na vida política da sociedade. No entanto, ainda que ele fosse ascendendo socialmente e politicamente, esse espaço era muito restrito.
No declínio do feudalismo para consolidação dos Estados modernos e regimes absolutistas, a classe burguesa foi ascendendo, ganhando corpo e relevância na sociedade, mas ainda sim, sua ascensão não estava completa. Ainda eram “pisadas” e tinha sua importância de classe “sufocada” pelo clero e pela nobreza “parasitária”. Nesse sentido, ideias e valores, como a ideologia liberal, tinham uma importância e relevância na luta de classes DAQUELA ÉPOCA, porque representavam verdadeiramente os interesses materiais da classe burguesa DAQUELA ÉPOCA. No entanto não estamos “numa França do século XVIII”.
Referendado em quais interesses de classe tais valores e ideologia poderiam ter alguma relevância na sociedade atual (como tiveram em outrora)?
Andando um pouco mais à frente na “linha da história”, depois das revoluções burguesas que eclodiram Europa adentro, veremos um fator muito bem observado pelos comunistas na questão econômica. É pelo interesse de acumular capital que os burgueses tanto combatiam a ideologia e os valores feudais.
O feudalismo que tinha uma economia de subsistência predominantemente agrícola tinha dentre seus valores morais o combate à questão da cobiça, usura e etc. Por exemplo, se você realizasse o empréstimo de quatro sacos de trigo, você não pode cobrar com juros de quem emprestou. Somente pode cobrar os mesmos quatro sacos de trigo.
A acumulação era combatida pela ideologia e moral dominante do feudalismo. Nesse sentido, os burgueses justamente lutaram pela liberdade de poderem acumular bens por meio da troca. Declinando o feudalismo, eles continuam no combate em defesa da liberdade da acumulação, que agora, não se dá somente na troca, mas também na apropriação do trabalho do outro. Cresce as relações pautadas no acúmulo de capital, bem como valores morais que defendam este tipo de relação.
Qualquer pessoa com mínima formação em economia e história compreende facilmente que a propriedade privada conjuntamente com a liberdade econômica (que surge na intenção de ser a liberdade de acumular Capital), desencadeia inevitavelmente na concentração de renda, na concentração de Capital.
Esta liberdade por questões óbvias desencadeiam na concentração, e a referida concentração, num certo grau de desenvolvimento, conduz ao monopólio.
COMO A CONCORRÊNCIA CONDUZ AO MONOPÓLIO

O capitalismo se desenvolveu com base na liberdade de mercado e na concorrência. Por muito tempo, as relações entre os Capitalistas e Proletários foram determinados pela concorrência, que nesses tempos, atuaram como mola principal do progresso capitalista. No entanto, as grandes empresas gozam de mais vantagens técnicas, financeiras, organizacionais, econômicas e políticas do que as pequenas empresas. O grande capital capaz de explorar um número maior de operários é inevitavelmente o que consegue vencer numa “competição econômica”, i.e., numa livre-concorrência. Essa relação é a base do processo de concentração e centralização do Capital.
Essas são as razões do porque a “concorrência honesta, democrática e progressista” de modo irrevogável desencadeia no monopólio pernicioso, parasitário e reacionário. Seu predomínio começou a se consolidar na década de 1880, e assumiu uma forma definida na primeira metade do século XX (século passado). Antes, a vitória do monopólio era reconhecida até mesmo pelos representantes oficiais da sociedade burguesa e por seus defensores. No entanto, quando Marx alegou que o monopólio é uma consequência de características inerentes do capitalismo, a sociedade burguesa continuou considerando a concorrência como uma lei eterna e absoluta.
A eliminação da concorrência pelo monopólio, nos deixa claro as engrenagens destrutivas que impulsionam a desintegração da sociedade capitalista. A concorrência era o principal impulsionador do progresso do capitalismo, e era a justificativa histórica da burguesia. A eliminação da concorrência firma a transformação dos acionistas em parasitas sociais. “A concorrência precisa de certas liberdades, uma atmosfera liberal, um regime ‘democrático’, um cosmopolitismo comercial. O monopólio, em compensação, precisa de um governo o mais autoritário possível, barreiras alfandegárias, suas ‘próprias’ fontes de matérias-primas e mercados (colônias). A palavra final da desintegração do capital monopolista é o fascismo”[1].
SE O LIBERALISMO SURGIU PARA ASCENDER O BURGUÊS, AGORA QUE A BURGUESIA JÁ POSSUI TODO PODER POSSÍVEL, NO QUE ESSE MOVIMENTO (LIBERAL) PODE INFLUIR?
Qual a utilidade então – do ponto de vista histórico e da luta de classes – da ideologia liberal nos dias de hoje? Sabemos que tornar a economia de um país plenamente liberal, só lhe desencadeará numa crise econômica que, eventualmente, desencadearia no monopólio.
Logo, qual a serventia disso para o progresso da sociedade humana? Se no final das contas, resulta no “andar em círculos”, por tratar-se de implementar uma “solução” que irrevogavelmente desencadeará novamente no problema que ela justamente quis solucionar?
O liberalismo, como movimento relevante, pautado em interesses de classe, hoje está morto.
Em outros tempos, a burguesia, se desenvolvendo enquanto classe precisou de valores, como o liberalismo, para ascender. No entanto, hoje, a alta burguesia, ao contrário do burguês oprimido da Idade Média, não quer meios para ascender, mas quer meios para manter seu Poder. Mande qualquer pessoa perguntar, ao Eike Batista ou aos donos de bancos como o Itaú ou Santander, se os mesmos desejam um “Capitalismo Laissez-Faire”.
No entanto, inúmeros grupos como o EPL (Estudantes Pela Liberdade), Instituto Mises, Instituto Millenium e etc., que são grupos que se autodenominam como liberais, permanecem minimamente expressivos. Com que propósitos estes agrupamentos permanecem como estão? Devido ao que, até agremiações internacionais financiam este tipo de grupo?
É por uma questão simples, não muito complexa.
O Liberalismo progressista do burguês sofrido da Idade Média e Moderna, já cumpriu seu papel histórico e se esgotou. Disso nós já falamos. Mas a conjuntura mudou, e o liberalismo não passou mais a ser serventia do Burguês, que agora é detentor do Poder. Seu objetivo agora é concentrar o Capital, monopolizar setores da economia em suas mãos e etc.
Agora, nos cabe aqui, uma analogia necessária: Imagine que em uma luta de ringue, um lutador seja franzino, pouco treinado, de categoria peso pena, e o outro, um lutador experiente, bem treinado, de categoria peso pesado. Sabemos que, nessas condições, a tendência fatídica da luta será a vitória do lutador peso pesado, e provável aniquilação do pobre garoto franzino. Bem, nenhum agente externo e interventor agiu nessa competição. E a vitória se deu fatidicamente ao “peso pesado”. O franzino? Foi destronado, está hospitalizado. Há a possibilidade até do mesmo morrer.
O Imperialismo (logo, o monopolismo) age de forma semelhante ao dessa analogia, só que no âmbito econômico. Por exemplo, o capital monopolista de algum burguês imperialista norte-americano, busca ser poderoso não em território americano (ou pelo menos, não apenas), mas sim também em suas colônias. Em certos países, esse tipo de relação econômica, causa certas reações políticas até mesmo com outros segmentos de burgueses. Um burguês nacional de um país espoliado pelo imperialismo se vê em maus lençóis ao ter que concorrer economicamente com um capital monopolista de um burguês estrangeiro e imperialista.
Isso inclusive aconteceu com o próprio Brasil. É só lembrarmos-nos de figuras como Getúlio Vargas, que no campo econômico agiu justamente nesse sentido: Para tentar garantir o progresso capitalista no Brasil, bem como em defesa do desenvolvimento da burguesia brasileira enquanto classe, buscou implementar medidas que diminuíssem a influência da burguesia imperialista no Brasil, para que quando se dessem as disputas, concorrência no mercado e etc., essa concorrência não conduzisse inevitavelmente ao monopólio e a vitória do capital estrangeiro de maneira irrevogável. Nesse sentido, buscou-se tentar fechar mais as fronteiras a intervenção estrangeira da economia brasileira, visando o fortalecimento da economia nacional. [2]
Nesses tempos, a ala mais “liberal” pregava justamente o contrário do que Vargas fez. A ala mais a direita de Vargas (economicamente falando), que era a ala mais liberal, pregava mais e mais abertura ao capital estrangeiro, mesmo que isso na prática desencadeasse algo contraditório do que defendiam. É justamente a competição desigual no âmbito econômico (e até político) que gera o Monopólio, e é justamente o Monopólio de maneira irrevogável ocorre na concorrência desigual. Se isso era uma verdade entre grandes e pequenos empresários do século XIX, que dirá entre corporações imperialistas e empresas nacionais de pouca influência. Tais liberais, dessa época, defendiam o “deixar passar, deixar fazer” por defender, sem perceber que isso inexoravelmente desencadearia no Monopolismo que eles tanto dizem combater em seus discursos.
FINANCIADOS, CAPITULADOS E ALINHADOS AO IMPERIALISMO
Os liberais atualmente, sobretudo em países espoliados pelo Imperialismo, como é o Brasil, agem justamente nesse sentido. Querem que o governo abra mais, mais e mais, a todo e qualquer capital. Para eles, o que importa é a livre circulação, independente de isso desencadear Monopólios ou não. Para eles, o que importa é defender a liberdade econômica por defender, como um valor e ideia imutável.
É nesse mesmo sentido, que os atuais liberais, ou melhor dizendo, Neoliberais agem na nossa sociedade. Pregando a liberdade por pregar [3]. Travestidos com um discurso de liberais burgueses do século XVIII, pregam que o Brasil se aprofunde mais e mais nas mãos do imperialismo e do capital estrangeiro. Sua capitulação pelo capital estrangeiro e pelo imperialismo não passa despercebida por nós comunistas, quando vemos esses grupos e institutos financiados por agremiações estrangeiras que tem interesses econômicos e políticos duvidosos com o Brasil. Nós percebemos claramente isso, quando observamos que este tipo de grupo ou instituto defende pautas claramente em coro com imperialismo e ao mesmo tempo são financiados pelos mesmos. Nós percebemos isso, quando vemos organizações como o Instituto Millenium – que são “aparentemente independentes” – utilizando dos seus grandes fundos de dinheiro para financiar a viajem da gusana Yoani Sánchez para o Brasil e para o mundo.
Os interesses políticos destas agremiações são pautados por quem lhes financiam, isso é, pelo imperialismo pelo qual eles são capitulados e alinhados política, econômica, e ideologicamente.
NOTAS:
[1] – Citação do renegado Trotsky de “O Marxismo em nosso tempo. O Pensamento vivo de Karl Marx”. Apesar deste trecho ser de quem é, possui utilidade didática para a finalidade do presente texto.
[2] – O autor do texto concorda apenas com as posturas anti-imperialistas da gestão de Getúlio Vargas, mas é alinhado ideologicamente ao Marxismo-Leninismo e não com a linha ideológica “varguista”.
[3] – A liberdade econômica.
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