Conversa com paisanos e fardados: porque não gosto de estadunidenses (por Coronel Paiva)
- Jornal A Pátria
- 5 de mar. de 2020
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Da coluna do Coronel Paulo Paiva sobre o interesse dos norte-americanos no nosso patrimônio ambiental.

Que ninguém duvide, desde os tempos do primeiro conflito mundial, passando pelo segundo, vestiram a carapuça dos “mocinhos do cinema” e, mesmo, o foram como verdadeiros "paladinos da democracia" pelo menos até o final do conflito no Vietnã, haja vista a incontestável corrida que os dois gigantes comunistas, a então URSS e a RPC, cada potência à sua maneira, deflagraram em prol da hegemonia do socialismo, em tantos países (...).
Mas, mesmo assim, o desígnio (uma verdadeira saga de domínio ultramarino) dos chamados, por alguns latino-americanos, de “grandes irmãos do norte”, já vinha mostrando suas garras, desde o anúncio do famoso slogan, que ainda domina sua política externa face à América Latina. Que ninguém olvide, por detrás da famosa Doutrina Monroe “A AMÉRICA PARA OS AMERICANOS” (entenda-se norte-americanos) ficou amalgamada a imagem que fazem de nós, sempre olhados como os cucarachos de seu quintal, massa de mão-de-obra não qualificada que quer por que quer imigrar para a “terra do destino manifesto”.
Mas por que tanto preconceito? Tanta malquerença? Seria isto de graça?
Devo começar relatando fato ocorrido em uma das tantas visitas feita por cadetes bem classificados das AGULHAS NEGRAS a WEST POINT, pouco comentado mas que chegou ao meu conhecimento, contado por fonte fidedigna.
A coisa aconteceu mais ou menos assim: recinto fechado, nossos cadetes adentram e, sem mais nem menos, de graça, são interpelados e chamados de “matadores de índios” pelos anfitriões, não faltando comentários sobre a Amazônia. A reação foi imediata (chego a me emocionar, orgulhoso do nosso jovem, oriundo da mesma Academia Militar... justo aquela de tantos de nós). O cadete altivo, que não deixou por menos, simplesmente respondeu na lata, fazendo uso da língua inglesa de habilitação acadêmica: “— Vocês podem até entrar na Amazônia, o difícil vai ser sair!”
Não vou ser repetitivo a ponto de relembrar as tantas declarações de tantos plenipotenciários, presidentes, chanceleres, políticos, enfim de todas as personalidades nascidas no país de “Tio Sam” que se reportaram sobre a Amazônia, contestando o direito legítimo de posse que têm os brasileiros sobre a, ainda nossa, grande Região Norte.
Estas já são de há muito do conhecimento público, todas tendo como lugar comum o jargão pleno de segundas intenções, como só em ser aquele do “patrimônio ecológico da humanidade”, tão cantado e decantado em versos pela chamada “comunidade internacional” (leia-se grandes potências militares, neste aspecto capitaneadas declaradamente pelos EUA). Que alguém me desminta se isto não condiz com a realidade.
Um outro fato de que não me esqueço, ano de 1993, foi em TEFÉ/AM, uns agentes do “DEA” (pelo menos é como se declaravam, tenho minhas dúvidas, quem garante se seriam ou não agentes camuflados da ”CIA” ou mesmo integrantes de uma equipe de “FE” do exército dos EUA), durante uma almoço no QG/16ª Brigada de Infantaria de Selva, se reportaram, em português bem entendível, aos atos “selvagens” contra turistas estadunidenses ocorridos àquela época na orla de uma praia carioca, nada mais nada menos do que um “arrastão” gigante perpetrado pela bandidagem do entorno. Eu particularmente não gostei do modo galhofeiro com que eram feitas as conotações (como dizem os gaúchos: “estava p... da cara”!) e resolvi “empregar a reserva”. Muito amuado, disse simplesmente que, antes de criticar, deveriam “olhar para o seu rabo” na medida em que, em Los Angeles/USA, os “arrastões”, mais ou menos ocorridos na mesma ocasião, todos por motivos de ódio racial, tinham sido bem mais graves e comprometedores do que se pode chamar de sociedade civilizada.
E agora me reporto a um problema ocorrido em El Salvador, com meu irmão, quando um oficial (se não me engano era MARINE, desses que parecem “ter o rei na barriga") resolveu ditar cátedra, justo no setor de desarme da guerrilha, da responsabilidade (de coordenação) do mano. Não é preciso dizer que foi convidado a se retirar, devendo na próxima vez se fazer anunciar à chefia do posto. Já o meu pai, quando no comando do 1º/Regimento Escola de Infantaria-REI, em São Domingos/República Dominicana, sofreu pressão do comando da tropa americana para admitir o acantonamento de um oficial das forças especiais/FE no estacionamento do batalhão brasileiro. Não é preciso dizer que foi em vão, primeiro porque o “velho” nunca foi um militar, daqueles “amadores de carteirinha”, sim, dos que acreditam em Papai Noel e nas boas intenções dos “yankees” que perambulam por toda a Manaus/AM, levantando todas as possibilidades e limitações do comando militar de área para o desencadeamento da imposta, lastimável e desacreditada estratégia da resistência; segundo porque foi apoiado totalmente pelo então Coronel Carlos de Meira Mattos, no comando da FAIBRÁS que, veterano da FEB como ele, nunca se permitiria cometer uma “sandice franciscana” deste calibre.
Quero ainda relatar um fato ocorrido comigo, quando à frente da Seção de Ensino/1ª Subchefia do Estado-Maior do Exército. Tinha um oficial de ligação do adido americano que, volta e meia, vinha pleitear vagas em cursos no EB. Espertamente o CGS/CIGS era o mais focado e, por razões óbvias, só Deus sabe como eu procurei não satisfaze-lo nas suas pretensões. O pessoal da seção, que sabia que eu não morria de amores pelo “filhote de John Wayne”, em determinado dia ficou na campana me esperando entrar no local de trabalho porque, é de pasmar, o “cara pálida”, que tinha chegado antes de mim, tão somente, havia se refestelado na minha cadeira para fazer um telefonema. Espanto geral! O homenzinho levou uma senhora “mijada”, daquelas que ele nunca imaginaria, retirando-se em seguida. Era só o que me faltava!
Agora, para finalizar, relato fato costumeiro nas reuniões/happy hour, oferecidos pelo EME de vez em quando a adidos militares. Parece que estou vendo, o adido alemão, muito simpático, vinha sempre conversar comigo e o assunto, para variar, era sempre sobre a Amazônia. Eu, que havia comandado um BIS, contei muitas mentiras para o “’chucrute”, procurando sempre pintar os “horrores” do que poderia ser uma campanha na selva brasileira. Interessante é que, sempre depois de mim, quem era seu próximo interlocutor? Não é difícil adivinhar, é de uma clareza meridiana, nada mais nada menos do que a figura de mister Dunbar, o venerável adido dos EUA, um oficial de cara antipática com o qual nunca conversei. Eu sei que num destes dias de “confraternização” (entenda-se de espionagem oficializada), eu estava de “ovo virado” e lá vem o leva-e-traz do condestável norte-americano pescar “piranhas”. Resolvi então assusta-lo.
Entre outras coisas lhe disse: -”Meu caro, que não se duvide, para vencer as forças alienígenas que por um acaso ousarem invadir a Amazônia, os brasileiros serão capazes mesmo de, num derradeiro esforço, incendiarem toda a floresta para assistir o invasor virar churrasco”.
E bati nas costas do “FRITZ”, como se dissesse...agora... pode levar o recado!
Meu Deus do céu! E o Mike Pompeo pleiteando uma base no território brasileiro!
Quem sabe a gente não concede uma bem adjacente ao Aeroporto Eduardo Gomes?
Durma-se com um barulho desses!
Camaradas “da luta””, por aqui vou ficando. Até mais ver.
Paulo Ricardo da Rocha Paiva
Coronel de Infantaria e Estado-Maior
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