'Saiu de casa prometendo trazer o jantar', diz filha de pedreiro morto na Vila Kennedy
- Jornal A Pátria
- 4 de set. de 2019
- 3 min de leitura
'Mineirinho', como era conhecido, trabalhava fazendo obras na comunidade e em Senador Camará.

RIO — Uma das cinco filhas do pedreiro José Pio Baia Júnior, a jovem Juliane Baia estava dormindo em casa quando um motorista de mototáxi a acordou contando que seu pai havia morrido. José Pio, era conhecido como "Mineirinho" em Vila Kennedy e trabalhava principalmente em reformas dentro da comunidade e em Senador Camará, bairro vizinho à favela.
Juliane é a única irmã a morar com o pai. Mãe de um menino, ela conta que o filho era o xodó do pedreiro, que sonhava em ser pai de um homem.
— Quando o neto nasceu ele ficou muito feliz, porque ele queria muito ser pai de um menino. Ele era muito babão dele. Mas hoje foi o único dia que meu pai saiu sem falar com meu filho. Nem um beijo de despedida ou um até logo. Ele saiu prometendo trazer o jantar, uma costela com batatas — conta a jovem
No momento em que foi baleado, o pedreiro estava reformando a laje de um amigo de longa data, o comerciante Moisés Domingues, a quem chamava carinhosamente de "Tio Patinhas". Segundo Juliane, o único problema do pai era que as vezes acumulava muitos serviços na comunidade e acabava se enrolando:
— Era uma pessoa muito alegre, tentava ajudar todos. Ele sempre dizia que trabalhava para dar para gente o que ele nunca teve — desabafou Juliane.
José Pio nasceu em Cachoeira Alegre, em Minas Gerais, e há 20 anos veio tentar a vida no Rio de Janeiro. Na cidade mineira ele trabalhava em um sítio e fazendo bicos em restaurantes, padarias e bares da região.
— Ele era muito querido aqui na comunidade. Fez obra praticamente em toda Vila Kennedy. Infelizmente, a gente sempre assiste a notícias assim na televisão. Agora, a gente quer saber quando isso vai parar — disse Jorge Baia, de 37, irmão de José.
Em nota, a PM informou que, durante a operação, na saída da Avenida Brasil, "criminosos armados atiraram contra os militares. Posteriormente, o comando o batalhão foi informado que um homem estaria ferido. Imediatamente, ele enviou uma equipe ao Hospital Municipal Albert Schweitzer, para verificar o fato".
A perícia da Polícia Civil, no entanto, concluíu, horas mais tarde, que Júnior não chegou a ser socorrido, e que em suas mãos, no momento em que foi baleado, ele carregava pregos, usados na obra. De acordo com os peritos, ele estava agachado, e preparava-se para pegar um isopor que outros dois ajudantes passavam para ele.
Moradores dizem que não havia tiroteio e que PMs atiraram na direção de pedreiro na Vila Kennedy
Moradores da Vila Kennedy afirmaram que não estava ocorrendo tiroteio quando o pedreiro José Pio Baia Júnior, de 45 anos, foi morto com tiro nas costas enquanto trabalhava na construção de uma laje, nesta terça-feira em uma casa da comunidade. De acordo com moradores e parentes, policiais militares teriam feito disparos em direção ao fim da Rua Gana, onde a obra era realizada, quando José Pio foi ferido.

— Ele não era bandido. Estava trabalhando. Não havia confronto. Recolhemos 14 cápsulas de fuzil aqui. Eles (PMs) atiraram para matar. Estavam na esquina da rua, e não havia confronto. Não foi bala perdida — disse um morador que pediu para não ser identificado.
Dono da casa onde a laje estava sendo construída, o comerciante Moisés Domingues, de 41, contou como o pedreiro foi morto.
— Ele estava de costas trabalhando com mais dois ajudantes. De repente, os tiros começaram e ele não teve tempo de se proteger. Os ajudantes ainda conseguiram deitar no chão, mas ele acabou levando um tiro nas costas — disse Moisés.
Felipe Grinberg, Via O GLOBO
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