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Sobre Trotsky e Stalin: Não invoquem a 'História' para chancelar absurdos


Sobre os colegas que estão se digladiando a respeito de Trotsky e Stalin ou o trostskismo e o stalinismo.


Não tenho interesse em entrar no debate de forma apaixonada como ele está sendo travado. História é minha profissão além de minha paixão. Eu opto por qual caminho eu entro nas discussões. Assim, teço alguns comentários técnicos porque, além de tudo este é essencialmente um campo de especialidade ao qual me dedico.


1) não é recomendável falar-se sobre a história da URSS, e sobre Stalin, com bibliografia escrita antes dos anos 2000. A abertura dos arquivos do leste europeu e da própria Rússia é tão significativa, brutal (em termos de conteúdo) e importante que praticamente tudo o que foi escrito antes de 2000 sobre o assunto carece de fontes confiáveis. Só para se ter uma ideia da profundidade do que falo, nos estudos sobre URSS este período é chamado de "archival revolution".


2) a imensa maioria, se não a totalidade, do que foi produzido durante a Guerra Fria contava com uma seleção de fontes reduzidíssimas quase sempre obtidas através de "entrevistas" feitas com "emigrados" que chegavam no mundo ocidental. Ou estas pessoas davam testemunhos ou traziam documentos contrabandeados. De qualquer forma, estas entrevistas eram financiadas pelo Departamento de Estado dos EUA em programas que hoje se demonstra serem pura propaganda política, como mostra David Engerman no livro "know your enemy".


3) a historiografia recente sobre Stalin acaba com alguns mitos como, por exemplo, o mito do "controle" que Stalin tinha sobre o partido, a URSS inteira e etc. James Harris e Sarah Davies demonstram isto de forma muito persuasiva no livro que organizam chamado "Stalin: a new History".


4) Há estudos atuais sobre história intelectual e história cultural que rompem com a ideia do "controle" do partido sobre todas as áreas do conhecimento e sobre o pensamento dentro da URSS. Controle que as visões antigas deviam à Stalin. O exemplo disso são os trabalhos de Benjamim Tromli, como no livro "Making the soviet intelligentsia: universities and intelectual life under stalin e Khruschev"


5) mesmo especialistas antigos, como Sheila Fitzpatrick, em sovietologia e historiografia soviética, têm se rendido às novas fontes e novas produções, mudando de forma contundente as narrativas produzidas. Pode-se comparar, por exemplo as narrativas nos livros de Fitzpatrick como "Everyday stalinism: ordinary life in extraordinary times" e "Magnetic mountain: Stalinism as a civilization" de Stephen Kotkin.


6) sobre o controle da narrativa historiográfica exercida pelos governos ocidentais durante a guerra fria há muitos bons trabalhos. Vale a pena ler "Who paid the piper" de Frances Stonor Saunders para começar. A pesquisadora americana levanta muitas e boas questões como, por exemplo, o papel de Hannah Arendt na construção do mito dos "dois demônios" que até hoje faz uma série de jornalistas mal informados (ou com mal caráter) replicarem aquela antiga narrativa nos mesmos termos.


7) O próprio conceito de totalitarismo (que já não se usava academicamente nos EUA e Europa desde a década de 70), hoje sequer pode ser invocado. Se você quiser saber o motivo, leia Michael Geyer e Sheila Fitzpatrick em "Neyond totalitarism" ...


8) Historiadores de profissão que não questionam suas narrativas estão fadados a serem instrumentos de dominação ideológica convencidos de que fazem história. Para entender este argumento vale a pena ler Andrew Hartman em "A history of the culture wars".


9) Uma crítica incipiente ainda mas com um bom embasamento de fontes a respeito do famigerado discurso de Khruschev (que serve de base para 90% das acusações a Stalin) pode ser lida em "Khrushev Lied" de Groover Furr. Entre outras coisas, muito pouca atenção o ocidente deu a como Khruschev eclipsou seus oponentes para se tornar líder soviético a partir deste discurso que nunca foi "secreto" como o ocidente fez parecer.


10) Quem quiser saber um pouquinho sobre o impacto da abertura dos arquivos basta ler https://www.jstor.org/stable/2679500


Quem não quiser, por favor, debata a partir dos seus amores e paixões, mas não invoquem a "História" para chancelar absurdos.


Do meu ponto de vista, que venho estudando isso há muito tempo, Stalin é um líder do século XX como qualquer outro. Brutal, pragmático, visionário e centralizador. Em nada se difere de Roosevelt, Churchill, Truman ou De Gaulle ...


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