Ucrânia: História e crise recente na Crimeia.
- Guilherme Melo
- 13 de mai. de 2021
- 5 min de leitura

Imagem, fonte: Israel Times.
Por: Guilherme Melo
A administração Putin trouxe elementos que a ciência política sozinha não é capaz de explicar, uma vez que seus discursos extrapolam a noção de burocracia governamental, alguns políticos gostam de se comportar como administradores, falando em público sobre os seus feitos num formato contábil e percentual, como em um relatório de balanço de uma empresa.
O que pode se notar à primeira vista é que seus pronunciamentos envolvem dados, mas estes nunca vem isolados, são acompanhados de uma dimensão qualitativo sobre os problemas de governo e de Estado da Rússia, ele busca explicar a relação da política com a sociedade em uma dimensão compreensiva, demonstrando elementos tanto do comportamento, como da história e burocracia que envolvem os problemas contemporâneos da Rússia.
Por isso, diferentemente das análises jurídicas ou econômicas a respeito da crise que envolveu a Criméia e o Estado russo, esse texto não tem o objetivo de ser um escrito jornalístico, acrítico e sem reflexões, que somente levanta dados de natureza numérica ou jurídica, demonstrando dados e artigos envolvidos nos textos que descreveram os acontecimentos da região.
Notamos que assim, a ciência torna-se profundamente pobre, por isso, respeitando, os limites metodológicos, o texto ainda assim explorará os elementos que envolvem a crise na Crimeia, os sintetizando e deixando claro quais as tramas que se passaram na região.
A burocracia governamental gere seus negócios com critérios objetivos, buscando uma racionalidade para com os fins (WEBER, 1979) porém em meio a um mundo já desencantado por uma política pragmática, o ethos por vezes surpreende nós que somos modernos demais para lidarmos com isso.
1. Defesa argumentativa:
O capitalismo moderno vincula-se a racionalização da vida prática, seja na empesa capitalista ou no governo, onde as empresas públicas vão criar metas, um corpo de funcionários especializados, métodos objetivos de recrutamento de pessoal e de execução das atividades públicas.
Por outro lado, não fora da modernidade, mas dentro dela, a subjetividade, criará uma racionalização política de outro tipo, a de idealização de um futuro, do sentimento de nacionalidade, de aspirações coletivas, que não são delírios, mas planos postos em prática.
O reencatamento da realidade é uma resposta alemã ao racionalismo francês, que ao propor uma exacerbada racionalização do mundo natural e social, cria critérios objetivos de explicação dos objetos, desprezando os elementos subjetivos que perpetram os anseios da humanidade e dos seres humanos como indivíduos.
Este sentimentalismo envolve o desejo místico e atração pela natureza como elemento de formulação desta corrente que defende estes argumentos chamada de “romantismo alemão”, o importante para este texto na relação do ser e do espaço é a noção de pertencimento geográfico que criará pensamento de uma nacionalidade orgânica.
“Na realidade, o romantismo alemão foi tão, ou mais, politizado
e politizante que o iluminismo mais conhecido” (BEISER, 1996, P.221)
2. História e política na Crise da Crimeia
É daqui em diante que os parágrafos anteriores serão entendidos na trama do evento político recente da Crimeia; a relação entre Ucrânia e Rússia antes das relações conflituosas que se dão desde a segunda guerra mundial, quando ambas eram duas Ex-Repúblicas soviéticas.
Do século IX ao XII, os russos, bielorussos e ucranianos eram um só povo, quando os mongóis dominaram a região que os três começaram a se diferenciar, o começo do império russo se tem na Ucrânia, antes chamada de “Rus de Kiev”, este nome se devia ao fato de que à época, o país era uma confederação de cidades-Estados governados pela dinastia Rurik, que mantinham vassalagem ao Grande Príncipe de Kiev.
“Como a florescente, mas desunida, Rus’ kievana foi dominada pelos mongóis, alguns analistas apontaram para seu caráter descentralizado como uma fraqueza.” (SEGRILLO, 2012, P.107)
Dentro do contexto mongol, na idade média, a Ucrânia foi fragmentada no século XIII, foi dividida em uma República de Cossacos e na Comunidade Polaco-Lituana, em meados do século XIV, o Estado foi conquistado por Casimiro IV da Polônia, a cidade de Kiev passou ao controle do Grão-Ducado da Lituânia, devido ao casamento real do grão duque Jagelão da Lituânia com a rainha Edviges da Polônia.
A União de Lublim, em 1569, criou a Comunidade Polaco-Lituana, uma porção do território ucraniano passou do domínio lituano para o polonês, essa união foi um acordo político assinado em 1 de julho de 1569, que transformou o Reino da Polônia e o Grão Ducado da Lituânia em um só Estado, a República das duas nações.
O monarca eleito exerceria função de Grão-ducado da Lituânia e rei da Polônia, no século XVII, no reinado de Catarina a Grande, a Rússia e a Prússia invadiram a Polônia, foi justamente depois de vitoriosa, a Rússia passou a dominar o território da Ucrânia.
Catarina não era um joguete nas mãos da nobreza. Tratando habilmente com ela, implementou várias de suas políticas próprias. Diminuiu as taifas protecionistas estabelecidas por Pedro, o Grande, liberalizando a economia. Ampliou o império a oeste partilhando a Polônia com a Prússia e a Áustria e alcançou outra saída permanente para o mar ao sul ao conquistar a Crimeia no mar negro.” (SEGRILLO, 2012,P.143)
A Ucrânia tem duas correntes e circunstâncias geopolíticas na sua longa história, uma é mais autonomista e nacionalista, a outra defende uma integração regional seja com a Rússia ou União Europeia, devido que no passado ela foi dominada por diferentes reinos.
Por isso, a nacionalidade ucraniana nunca foi bem resolvida, pois o país teve contribuições de cossacos, poloneses, mongóis, turcos e russos na sua formação étnica e social, conquistou a independência no ano de 1991 com o fim da URSS, além que 1/3 de sua população é de origem russa. (AMAL, 2017).
3. Contexto recente
Em 2010, Víkton Yanukovych foi eleito presidente, num contexto geográfico e social de uma população dividida pela influência seja do Império Austro-Húngaro na sua parte ocidental e russa na oriental, onde respectivamente existem majoritariamente uma população protestante e católica ortodoxa.
De dezembro de 2013 a fevereiro de 2014 ocorreram conflitos civis decorrentes de fortes protestos, em especial da Ucrânia ocidental, que tinha a expectativa de se integrar ao bloco europeu e de fazer acordos comerciais intercontinentais, acusado de ceder à pressão e ofertas russas, os acordos não foram realizados.
A praça Maidan, localizada na capital Kiev, marco importante dos protestos contra o governo, a tensão aumentou e os protesto ganharam força gerando movimentações de rebeldes que invadiram prédios do governo, temendo por sua segurança, Yanukovych foi exilado em Moscou.
A percepção majoritária da sociedade russa é que o Ocidente, entendido aqui por União Europeia e os Estados Unidos estavam promovendo desestabilização de seus aliados na Ucrânia para promover agendas de seus interesses, como acontecido na Geórgia em 2008.
A grave crise social que dividiu o país, pôs os russos étnicos do país e apoiadores do presidente deposto em situação de medo, o que provocou uma guerra civil no sudeste do país, mas a Crimeia, antiga cidade russa até 1968, quando Nikita Kruschev a pôs sob administração ucraniana prevalecia de privilégios de estatutos a respeito de procedimentos de como se reintegrar à Rússia, por meio de referendo.
A circunstância pôs favoravelmente a posição russa de desenvolver uma geopolítica estratégica de acesso ao mar negro, mas também de criar um soft power com base no resgate de raízes históricas da russa que inspirasse uma noção étnica de nacionalidade e de estratégia de política externa.
Referências
SEGRILLO, Angelo. Os russos. São Paulo: Contexto, 2012, p.107, p. 143;
BEISER, Frederick C. (ed.). The Early Political Writings of the Germans Romantics. Cambridge, Cambridge University, Press, p.221.
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